Itapoá: de todos, para todos
Com a chegada do Porto Itapoá, um novo ator passou a fazer parte da vida da cidade litorânea. Uma das responsáveis por uma transição benéfica é Patricia Dall ‘Onder Diez, coordenadora da área de Sustentabilidade da empresa.
Você trabalhou em Recursos Humanos por muito tempo e recentemente passou a atuar em Sustentabilidade e Investimento Social. Como foi essa mudança?
Foi algo bem grande para mim. Antes, havia trabalhado com Recrutamento e Seleção em consultorias. O Porto Itapoá foi a primeira grande empresa em que trabalhei. Já estou aqui há oito anos, e há cinco no departamento de Gestão e Desenvolvimento de Pessoas (GDP), à frente da área de Sustentabilidade (que gerencia o Investimento Social).
O ponto comum entre essas atividades é lidar com pessoas. Inicialmente, desempenhava no Porto a mesma função com a qual atuava anteriormente. Meu trabalho era muito mais focado nas necessidades da empresa. Eu alocava pessoas certas em lugares certos dentro de companhias certas. No entanto, o que vivo hoje com a comunidade... é diferente. O projeto se torna certo para a sociedade a partir do momento em que ela mesmo desenha sua necessidade. Não pode ser vertical, outorgado.
O meu “cliente” mudou bastante. Hoje escutamos muito os moradores, pensamos em como trabalhar projetos com a comunidade para que futuramente alcancem impacto, culminem em uma transformação social. Se fizermos um comparativo com minha função anterior, podemos dizer que antes olhávamos o potencial de um candidato para a carreira que ele poderia eventualmente alcançar. Hoje, vendo os acontecimentos da comunidade, é possível já vermos lá na frente, mensurar o potencial de transformação que um projeto tem. É uma mudança de visão.
Como é a experiência de começar uma área do zero?
Nunca havia imaginado em trabalhar com a área social. Minha formação é em Psicologia e originalmente pensava em clinicar.
Quando minha gestora falou comigo sobre a ideia de criar uma área de Sustentabilidade para trabalharmos projetos ao lado dos moradores, confesso que fiquei dois dias sem dormir direito (risos). Foi algo que me tirou da zona de conforto. Sempre fui muito inclinada a melhorar o meu entorno, mas nunca soube direito de que forma isso poderia acontecer. A oportunidade veio quando se abriu a possibilidade de montarmos uma área inédita na empresa.
Nosso setor é muito especial. Ele recebe o nome de Área de Sustentabilidade, dentro da Gestão de Pessoas, justamente pela preocupação com o lado humano. Hoje a forma como a própria empresa e os colaboradores enxergam os projetos que fazemos para a comunidade mudou muito. Isso tem muito a ver com o trabalho que desenvolvemos. Atualmente somos muito voltados para projetos de cunho social; é a parte do tripé sustentável que mais precisa de fortalecimento hoje. Estamos consolidados, com planos de longo prazo. É uma construção muito inspiradora.
O conhecimento acadêmico também ajudou. A Psicologia traz uma possibilidade de leitura profunda do ser humano, e isso pode ser aplicado em diversas atividades. Entender o outro me ajuda na empatia, na compreensão da história de vida das pessoas e lugares, das experiências... isso contribuiu muito para que passássemos de um relacionamento mais técnico para um muito mais humanizado. Nunca estivamos tão em sintonia com a comunidade como nos últimos anos.
Pode nos dar outro exemplo de práticas bem-sucedidas em sua área?
Uma experiência ótima é nossa Mostra de Artesanato Local. Essa prática, o artesanato feito por mulheres, sempre foi um ponto forte da comunidade. No entanto, percebíamos que não se tratava de um grupo muito organizado, o que não trazia tanta força à atividade.
A partir de um pedido de cessão de espaço para venda desse artesanato, notamos uma oportunidade de fortalecer esse grupo. Com a ajuda das artesãs, do Ampliar (nosso projeto com maior envolvimento com a comunidade) e a Comissão de Geração de Renda, conseguimos montar a Mostra de Artesanato Local, que reúne os três bairros de nosso entorno. Hoje temos em torno de vinte artesãs expondo.
Esse projeto está em seu segundo ano; a exposição e venda de seu trabalho vai durar toda o veraneio. Sentimos uma transformação acontecendo com essas mulheres: muitas saíram de uma situação de pura dependência na família, tornando-se pessoas que de fato contribuem com a renda da casa. Há, também, diversos depoimentos de artesãs depressivas que conseguiram mudar esses quadros por conta da atividade.
Vemos o Porto Itapoá como incentivador de várias ações feitas pelo município. Há várias sementinhas de coisas a ser feitas pela cidade. Regamos para que elas possam florescer.
A sustentabilidade é uma estratégia empresarial importante? Sua relevância vem crescendo?
Sem dúvida. O cliente, inclusive, também está ficando mais exigente nesse sentido. Ele quer saber se seu fornecedor é coerente com suas crenças, e essa mentalidade tem ganhado espaço de forma bem rápida.
Aqui no Porto, por exemplo, estimulamos o consumo: bens são importados e exportados por nós e vão para as casas das pessoas. Então com certeza há algo a ser feito internamente. Trata-se de uma grande estratégia para trazer o cliente, ser mais competitivo em relação a outros portos e empresas.
A sustentabilidade tem conquistado espaços maiores e mais estratégicos; hoje, ela é discutida não apenas por funcionários específicos, mas também pela alta gestão. Nosso planejamento estratégico global é totalmente baseado no tripé da sustentabilidade. Isso mostra a relevância que o tema ganhou.
Não há como o tema não crescer em importância. Se ele não for pensado agora, simplesmente não há tempo depois. Precisamos urgentemente repensar nossa forma de consumir e nossa responsabilidade para com o futuro.
Como mostrar às pessoas a importância de sustentabilidade e investimento social?
Primeiramente, sendo exemplo. Dificilmente vou convencer alguém de que o assunto é importante se eu também não acreditar nisso ou não ser coerente com minhas ações.
Os próprios projetos também mostram às pessoas que a sustentabilidade é possível. Atuamos muito com princípios de economia solidária, por exemplo. Demonstramos que se alguém fizer algo somente para si, o ganho é muito pequeno. No entanto, se agimos pensando na coletividade, é possível multiplicar resultados.
Criamos oportunidades pensando sempre nos benefícios para a comunidade e colaboradores internos. Tudo é potencializado quando pensamos em grupo. Para isso, devemos orientar, ser exemplos dessas práticas. Isso faz a diferença.
Por exemplo: por ser uma cidade pequena, aqui ainda há uma cultura de troca, de partilha. Eu plano mandioca, você planta milho, nós trocamos e todos se beneficiam. Cabe a nós ajudar a manter essa cultura viva.
Sobre a atuação com as comunidades, quais são pontos importantes a se considerar?
Trabalho com um público bem diverso; logo, meu discurso depende muito do interlocutor. O teor sempre presente, no entanto, é o estímulo à coletividade. Isso faz com que não olhemos apenas para melhorias individuais, mas para o que é bom para todos.
“QUANDO OLHAMOS COM CUIDADO PARA AS PESSOAS E SEUS POTENCIAIS, OBTEMOS RESULTADOS INCRÍVEIS”
O Projeto Ampliar é exemplo disso. Ele tem um potencial enorme de mudar as dinâmicas da comunidade. E hoje, mais do que nunca, ela se apropriou de vez do projeto e viu que é possível, de fato, melhorar as situações. Percebo uma transformação, inclusive, nas propostas: os proponentes elaboram projetos de cunho cada vez mais social, sem almejarem benefícios próprios. Consultam os moradores, veem suas necessidades, veem quais ações serão mais eficazes.
A comunidade já fala de uma forma diferente. O que sempre busco trazer em minha fala, para inspirá-la, é esse viés coletivo. Eles compreendem cada vez mais.
Você vê como importante o envolvimento da comunidade nos projetos?
É extremamente importante que ela se envolva! Nós chegamos aqui, somos a maior empresa do município. A dinâmica do entorno mudou com nossa chegada. Logo, precisamos fazer com que os bairros e pessoas se desenvolvam com nossas atividades. Se a empresa não acreditasse nisso, tornaríamos a comunidade muito dependente de nós. É preciso proporcionar autonomia a eles, tanto em relação ao Porto como em relação ao desenvolvimento de todas suas outras potencialidades.
A missão da Sustentabilidade, em relação ao social, é desenvolver ações de incentivo para que a comunidade encontre seu próprio caminho de desenvolvimento. De fato, percebemos que as coisas estão mudando. O maior indicador: há cinco anos, o número de projetos que recebíamos com pedidos simples de patrocínio era muito maior do que o que eu recebo hoje; atualmente, são muito mais elaborados, com contrapartidas, planejamento. Começa-se a ver que o olhar em relação ao Porto como provedor mudou; eles alcançaram sua independência. Esse é nosso principal indicador de sucesso.
Qual a importância específica das lideranças comunitárias no desenvolvimento local?
São fundamentais em todo o processo. Nossos bairros eram mais frágeis no aspecto de liderança. Por isso, desenvolvemos hoje um trabalho para a formação de jovens líderes.
Itapoá é uma cidade com muitos conflitos. Desentendimentos geracionais, entre bairros... isso dificulta a atuação de lideranças. Entendemos como crucial sua presença; assim podemos dialogar e ser construtivos ao lado da comunidade.
Nosso projeto estimula jovens a assumir papéis na comunidade. Hoje, alguns já despontam como os maiores proponentes de projetos do Ampliar. Entendo isso como um sinal de mudança positiva. Fico impressionada com suas capacidades. São diamantes sendo lapidados. São a inspiração dos demais.
Por que é importante que as pessoas cuidem de suas comunidades?
Porque é o lugar em que vivemos! Nela compartilhamos, nela passamos boa parte de nossas vidas. É nela que estão nossas histórias e memórias. Nela viveram ancestrais, nela muitos filhos viverão.
Devemos preservar o que temos de bom em nossa comunidade. Isso exige dedicação, exige que gostemos do lugar em que vivemos. Se não cuidarmos de nosso lar, como será possível gostar dele? É necessário que tornemos nosso entorno um lugar cada vez melhor para se viver.
Não estou falando de grandes atos; não se trata de nada extraordinário. Ter uma boa relação com os vizinhos, colaborar com o progresso coletivo... pequenas coisas. A mesma compreensão que você espera é a que você deve oferecer. Pura ação e reação. A comunidade lhe oferece aquilo que você oferece a ela.
Sempre há algo a se fazer; é preciso ter um senso de responsabilidade pelo todo. Você está aqui de passagem, mas e quem vem depois? A forma de pensar das pessoas daqui está mudando. Há poucos recursos, mas conseguimos fazer muito com o que temos. O quão abundante serão as melhoras quando não houver mais essa escassez?
Os outros sempre podem se inspirar. Falar “eu também posso”, “eu também quero”. Quando damos à população condições de lutar por aquilo que acham certo, cria-se um encorajamento, pois descobrem que também há outros dedicados às mesmas causas. Encontrar companheiros sempre é bom.
Dentro disso, é necessário que se busque, além do engajamento próprio, o comprometimento de todas as entidades envolvidas. Somente quando todos estão cientes de seus papéis conseguimos alcançar os objetivos, as melhorias propostas. E o resultado é sempre positivo.
O Projeto Ampliar é um espaço de diálogo para discutir, de forma participativa, temas importantes e projetos comunitários que visam o desenvolvimento dos bairros Jaguaruna, Figueira e Pontal. Saiba mais clicando aqui.
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